PCHs buscam novo fôlego para competir

Além de maior rapidez na aprovação de projetos pela Aneel, investidores pressionam por condições de financiamento e de acesso a leilões

Canal Energia, 15/08/2014

O retorno definitivo aos leilões regulados de energia continua sendo um a meta ainda não alcançada por investidores em pequenas centrais hidrelétricas. Eles sonham com um a nova oportunidade para a negociação de contratos de comercialização de longo prazo, como os do A-5 de 30 de setembro deste ano, que pode abrir portas para o financiamento de projetos que ainda não saíram do papel. O preço-teto, no entanto, terá de ser convidativo para que os 23 projetos de PCH inscritos no certam e sejam com petitivos.

“O preço-teto não deve ser um inibidor. Pelo contrário, deve ser um estímulo. Defendem os que ele fique na faixa de R$ 180/MWh. Se os empreendedores enxergarem a possibilidade de entrar no leilão, eles vão se mobilizar e apresentar um a quantidade significativa de projetos”, prevê o presidente da Associação Brasileira de Geração de Energia Limpa, Charles Lenzi. Ele admite algum avanço no preço máximo definido nos leilões para a fonte, que saiu no ano passado de R$112/MWh para R$ 140/MWh e, no ultimo leilão, chegou a R$ 148/MWh.

O executivo da Abragel calcula que se forem somados os empreendimentos com autorização que ainda não iniciaram as obras àqueles sem licenciamento ambiental, o número chega a, aproximadamente, 1 mil projetos de usinas com capacidade instalada total em torno de 10 m il MW. E, o mais importante, com a vantagem de estarem próximas ao centros de carga.

Para o presidente da Associação Brasileira de Fomento às Pequenas Centrais Hidrelétricas, Ivo Pugnaloni, “chega a ser paradoxal que o governo promova leilões no qual exige que os preços de energia das PCHs sejam 34% menores que há dez anos, quando entraram as primeiras usinas do Proinfa. “O Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica foi criado pelo governo a partir do racionamento de 2001, para a contratação de energia de fontes com o pequenas hidrelétricas e usinas eólicas”.

Pugnaloni acredita que essa exigência tem efeito inverso, porque direciona o leilão para outras fontes.”É a mesma coisa que dizer ‘eu quero comprar bastante energia térm ica’, porque os empresários não vão querer entrar em aventura e não conseguir cum prir os contratos”, diz. Pelos cálculos do presidente da AbraPCH, existem 9.200 MW em projetos elaborados, entregues e parados na Agência Nacional de Energia Elétrica; além de 2.200 MW em projetos já aprovados, que não podem ser construídos porque o preço ofertado pela energia está abaixo do que seria aceitável para o investidor.

“Hoje tem os um a grande demanda de projetos e a Aneel tem esse desafio”, reconhece o diretor da autarquia André Pepitone. Ele lembra que o órgão regulador está rediscutindo alterações nas regras de aprovação de projetos de PCHs e informa que ao analisar as normas de definição do potencial hidráulico ele vai se concentrar em três fatores: queda, vazão e energia correspondente . “O foco vai ser no potencial hidráulico. Vamos deixar o empreendedor cuidar do projeto”, acrescenta o diretor.

Além de rever o regulamento, a agência reguladora tem trabalhado na simplificaçao da análise dos estudos de viabilidade e dos projetos básicos das usinas, e interagido com os órgaos ambientais de estados e municípios para dar maior rapidez ao processo de licenciamento. A ideia é que ao receber o projeto para análise a Aneel possa sinalizar para o empreendedor qual será o prazo máximo para sua aprovação ou rejeição.

A liberação m ais rápida de projetos é um a boa notícia m as não resolve, por si só, os entraves que tornam inviável a participação das usinas hidráulicas de 1 MW a 30 MW nos leilões para o mercado regulado. O leilão A-5 previsto para setembro deste ano é destinado à contratação de energia elétrica de novos empreendimentos de geração e

prevê a participação de usinas de fonte hidrelétrica, eólica, solar e termelétrica a carvão ou a gás natural em ciclo com binado e a biomassa. O prazo para início de entrega da energia, previsto para 1º de janeiro de 2019, é atrativo para um a usina de pequeno porte que ainda vai ser construída.

A junção, porém, em um a mesma disputa, de projetos de fontes com diferentes características não é o mais recomendado para garantir a oferta, alerta o coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da UFRJ, Nivalde de Castro. “Nosso grupo acha um equívoco manter essa política de fazer um leilão genérico. Defendem os um leilão por cota para cada fonte. Essa seria um a alternativa”, explica o professor. Castro argumenta que haveria competição dentro da cota, por exemplo, entre PCHs. Lenzi concorda com a ideia de com petição entre os próprios pares. Ele conta que entre pequenas hidrelétricas alguns projetos são m ais competitivos que outros.

Responsável pelo grosso dos financiamentos concedidos aos grandes projetos de infraestrutura no país, o BNDES já melhorou as condições de financiamento dos empreendimentos de fonte alternativa, com mudanças nos prazos e nas condições de enquadramento. Mas poderia ser melhor, na opinião dos investidores. De janeiro a junho deste ano, os financiamentos do banco para projetos hidrelétricos chegaram a R$ 3,151 bilhões, contra R$ 11,346 billhões em todo o ano passado. Já os empréstimos para empreendimentos de energia renovável, na qual as PCHs estão inseridas, atingiram R$ 1,197 bilhão nos seis primeiros meses de 2014 e fecharam 2013 em R$

4,181 bilhões.

“A gente continua discutindo com o BNDES e argumentando que poderia ter um a condição similar à das hidrelétricas. Esperam os avançar nesssas discussões”, diz Lenzi. Pugnaloni, da AbraPCH, afirm a que há discriminação no tratamento dado pelo banco às pequenas usinas hidráulicas. Ele diz que existem 173 projetos com outorga, que estão parados porque a instituição exige com o garantia de financiamento a apresentação de contratos de venda de energia com pelo menos dez anos de prazo. “Precisam os do leilão do governo, porque os contratos no mercado livre são de curto prazo. Q uem com pra não quer ficar preso a um contrato longo”, pondera.

Afinal, se a PCH é um a fonte descentralizada, opera praticam ente a fio d’água, tem reservatórios pequenos e impacto ambiental reduzido, além de um a cadeia produtiva totalmente nacional, com o destaca Pepitone, porque o custo de produção permanece elevado em relação a outras usinas? “O problema é de escala, porque o equipam ento é caro para o que ele vai produzir”, responde o coordenador do Gesel. “Tem um custo que dá um preço-teto elevado. Poderia melhorar isso pelo lado do financiamento, buscar um a engenharia financeira inovadora. E, quem poderia ter isso, é o BNDES”, afirma Nivalde de Castro.

Lenzi reconhece que não há muito o que fazer em relação à economia de escala, que faz com que o custo de um a grande usina com o Belo Monte seja bem menor que o de um a pequena hidrelétrica de 20 MW. Ele destaca, contudo, a eficiência dos equipamentos e lembra que a tecnologia usada no Brasil é o que existe de mais moderno no mundo para a esse tipo de fonte.

Pugnaloni conta que o aumento da eficiência das turbinas acompanhou a evolução da eficiência dos motores elétricos nos últimos 20 anos. “O que acontece é que embora os preços de equipamentos com as melhorias que tivemos estivessem nos mesmo níveis de dez anos atrás, os preços da construção civil cresceram muito, devido aos programas habitacionais do governo federal; assim com o a disponibilidade de crédito. Teve também a questão dos projetos estruturantes – estradas, aeroportos, portos, grandes usinas – e tudo isso fez com que os custos da construção também se elevassem bastante”, avalia.

Os empreendedores têm reclamado, e muito, da norma da Aneel que, segundo eles, exige das PCHs uma performance operacional maior que a das UHEs ao fazer um a revisão da garantia fisica das usinas a cada seis meses. Em consequência dessa avaliações periódicas, m ais de um a centena de reduções de garantia fisica de PCHS teriam ocorrido desde 2012, o que é um risco adicional na visão dos geradores e dos financiadores, explica Lenzi.

Dados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica mostram que nos ultimos 26 meses a energia média efetivam ente produzida pelas PCHs tem ficado acima das hidrelétricas, embora com a hidrologia ruim todos os empreendimentos hídricos tenham gerado abaixo de sua garantia física. O fator de capacidade, que é a proporção

entre a geração efetiva da usina em determinado período de tempo e sua capacidade total, ficou na média em 52%, contra 51% das grandes hidrelétricas.

Pepitone defende a regra e diz que ela é adequada, porque a energia gerada tem que ser equivalente à garantia fisica da usina, tanto no caso das PCHs quando no das hidrelétricas. “Tem os limites, e esses limites, a meu ver, são tolerantes. A proposta é coibir os chamados vampiros de MRE [Mecanismo de Realocação de Energia, que permite o compartilhamento do risco hidrológico entre as usinas].”